07 fevereiro, 2015

Ela é aquilo que não se vê





















Parece que nunca muda, é o mesmo casaco de sempre. Balança os cabelos para todos os lados achando que é madura o suficiente. Mas ela é e todos já perceberam. Mas a verdade é que muda como a lua. Cada vez que vira a esquina, com a intenção de se perder em alguma estrada. Ela é capricorniana legítima: cética, metódica e introspectiva. Completamente fora do alcance. Se guarda como se precisasse se descobrir por inteiro, em um corpo que já não lhe carrega, em uma cultura que já não lhe pertence, em uma certeza que já não sabe se tem. Ela não se limita no amor, tão pouco na amizade. Mas se tranca completamente num gesto insano de transtorno antissocial. Conhece mais dos tênis que dos olhos dos outros. Essa mania louca de olhar para o chão.
Adorou ter tido a ausência de perspectiva como desculpa para começar a escrever. Fez da escrita sua mais nobre fragilidade. Nunca olhou com verdade para a janela do quarto, nem descobriu o que existia nos corpos que ela se negou a tocar. Ela sofre por sempre perder a oportunidade de viver e se entregar. Adora quando as lágrimas deixam seus olhos brilhantes ou quando um poema dá certo. Ela, ateia, já fez prece para o sol se negar a nascer; mas ele sempre insiste, e queima sua pele que já é negra por natureza. Ela trepa com os próprios botões, como já dizia Bukowski, seu escritor preferido. Tão pessimista quanto o velho; tão cética quanto Nietzsche e tão detalhista quanto os olhares de Machado. Adora ver os detalhes que ninguém mais vê e se nega a lidar com distâncias.
Ela sente que deveria falar menos de sua vida e que não dá para continuar do jeito que está. Mas ela jura, de pé junto, que da próxima vez que virar a esquina, ela vai se encontrar.

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