posso mesmo falar um palavrão?
puta que pariu, meu senhor, como eu poderia saber que acabaria desse jeito? tudo bem, eu vou tentar não emendar tudo. quando me pediram pra fazer um troço que eu precisaria falar muito e um outro rapaz precisaria digitar tudo o que eu falasse, por sinal, muito bonito aquele moço de pulôver marrom, me disseram depois que o teclado dele tinha dado uns problemas e algumas letras não funcionavam, o que quero dizer é que boa parte do que falei, saiu errado por culpa do teclado e o rapaz, tadinho, nem percebeu. apesar de um bom tempo esperando ajeitarem tudo e ter que passar pelo mesmo procedimento duas vezes, eu não o culpo. ele me chamou pra sair depois da agonia, nordestina e umas cervejas. ah, mas não é isso que quero dizer, desculpa. na verdade é sim, só não posso, adoraria continuar falando do quanto aquela barba bem feita me impressionou. não sou de dar elogios, assim, de graça, o tempo todo, sem receber gratificação, mas isso, vocês sabem, e é o que eu devia ter falando desde o início, eu sei, me perdoem mas é que se vocês não mandarem eu calar minha boca, passarei o dia inteiro falando sem me importar se estão prestando atenção ou não. ok, ok, assim, um rapaz de branco, e eu só percebi que ela tava todo de branco depois de umas abaixadas que ele deu na minha frente, deu com a mão assim pra mim enquanto eu andava na rua quarto-setenta, umas oito horas, o que eu estava fazendo às oito da noite perto da fronteira? bom, eu me mudei pra uma rua, quase um beco de tão pequena, e assim, faz uns meses que não fumo, sabe, tabaco, claro, o senhor acha que eu estaria fumando o quê? e tive um troço estranho, vi na internet uma forma de deixar o cigarro pendendo pra baixo, sem cair, e se você batesse a piúba ficaria mais presa, daria pra passar mais tempo fumando, o senhor entende? e eu quis testar isso imediatamente. só tinha lojinhas abertas perto da fronteira, assim, nada clandestino eu acredito, mas abertas essa hora o senhor queria que eu fizesse o quê? aí, então, esse rapaz tava lá na esquina da quarto-setenta, usando umas sandálias tão bonitas, eu quis encostar nele só pra ver melhor aquelas sandálias azul-turquesa, e a minha sorte, eu pensei na hora, é que ele deu com a mão assim pra mim como se chamasse um ônibus apressado, ele não gritou nem nada, só fez uns giros com os dedos, uns gestos que, minha nossa senhora, eu não esqueço nunca mais. ele perguntou se eu tinha isqueiro, e, claro, me acostumei a vida toda a andar de isqueiro, mesmo quando não fumava, pra emprestar assim às pessoas que me param na rua, contidas, e pedem por favor, bicho, faz uma concha aí pra eu acender esse negócio. mas eu saí tão apressado-agoniado-desdentado de casa que mesmo isso eu esqueci. aí eu falei assim pra ele que minha casa ficava a umas quatro ruas daqui e perguntei se ele não queria passar lá comigo pra eu emprestar meu isqueiro. mas, meu senhor, qual o problema ele ser um estranho? era só entregar, acender, pá, pum, foi-se embora a sandália mais bonita que vi na vida. mas não foi isso que aconteceu, graças ao senhor, pensei cá comigo, o rapaz olhou pra mim depois que fomos e acendemos o cigarro dele, o meu cigarro, a gente sentou nuns banquinhos de madeira na porta de casa, ele colocou a mão na minha coxa o senhor quer mesmo todos os detalhes? pois então, ele pegou na minha coxa sem apertar nem nada, só pôs a mão assim como se quisesse sentir que eu ainda tava ali aí eu comecei a reparar que ele talvez estivesse bêbado e talvez eu quisesse que aquela mão apertasse com força por entre as minhas coxas, devagarzinho assim, como se não quisesse apenas a minha coxa dentro das mãos. olha, me desculpa, eu nem me sinto tão a vontade assim pra falar disso mas a questão é que ele olhou pra mim, um olhar de fome, digo, eu tive até medo naquele momento mas ele olhou tão estranho e tão bonito de uma forma, ele pediu pra chupar meu pau. assim, direto, na lata: posso chupar seu pau? eu quis dizer que não, que não dava. tava tarde, tenho muito trabalho amanhã mas a verdade é que não tava tarde, eu não tinha nada pra fazer amanhã e é claro que sim, claro que dá, pode ser agora? aí ele fez lá mesmo, no banquinho de madeira, eu ainda senti uns fiapos na calça entrando assim de lado, ele perguntava se tava bom já que eu não falava nada, eu só olhava pra quela sandália azul-turquesa e aquele homem todo de branco levantando a cabeça debaixo de mim. ele tava bêbado mesmo, meu senhor, eu só consegui perceber o cheiro e a cor vermelha de vinho no meu próprio pau, ficou assim por um bom tempo. mas ele, ora, ele foi embora logo em seguida, levou meu isqueiro, não me falou mais nada. como eu não percebi o fogo na minha calça? o fogo tava dentro da gente, meu senhor, você consegue entender? aquela quentura veio vindo pelas minhas pernas eu imaginei qualquer coisa, uns cuspes em temperatura elevada, jamais fogo, jamais chama, jamais aquele homem bonito queimando o meu corpo. deixei que viesse tudo, deixei minha pele arder toda pra saber se era real. e foi, né, claro que foi. o melhor de tudo, meu senhor, já dá pra saber? agora, da próxima vez que eu olhar aquele homem de branco na minha frente, vou estar sempre sentado, mais perto das sandálias dele.
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